A temática “proteção de dados e privacidade” tem ganhado cada vez mais destaque no Brasil. O tema se demonstra extremamente presente em debates jurídicos Brasileiros. Isso acontece bastante na arena Judiciária, na forma de produção acadêmica ou até mesmo como um produto da prática jurídica cotidiana de profissionais que buscam aplicar a Lei nº 13.709/18 (Lei Geral de Proteção de Dados). Com a utilização da norma, é possível construir interpretações em torno de pontos que a norma deixou em aberto ou cujo texto dá margem a diferentes leituras. Essa talvez seja a principal justificativa para a existência de um legítimo interesse na LGPD por parte de muitas empresas.

Note que, no Brasil, os casos geralmente são frutos de um comando expresso da LGPD, ou de uma demanda geral de esclarecimentos para uma aplicação mais uniforme da lei. Por aqui, o principal órgão responsável por aparar as arestas e buscar a resolução de problemas dessa natureza é a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). A entidade publicou, em 28 de janeiro de 2021, sua agenda regulatória para os próximos dois anos, em que elenca os temas sobre os quais irá se debruçar no biênio. No documento ainda estão os prazos para dar início ao processo de regulamentação, variando de acordo com níveis de prioridade.

Outro ponto importante é que a lista compreende uma série de estabelecimentos. Estes, de maneira geral, são responsáveis por procedimentos para comunicação de incidentes de segurança até a criação de um guia de boas práticas sobre as hipóteses legais de tratamento de dados pessoais.

A história do legítimo interesse na LGPD

Legítimo interesse na LGPD

O interesse legítimo na LGPD é produto de um longo processo judicial. Este englobou intensa construção jurídica. É preciso compreender que não há hierarquia entre as bases legais elencadas no art. 7º da LGPD, e a escolha por uma determinada hipótese para lastrear o tratamento de dados pessoais depende das circunstâncias concretas e da sua finalidade.

E, para muitos especialistas na área tributária, não há que se falar em uma base legal mais ou menos intrusiva, a priori, mas apenas em bases legais mais ou menos adequadas a uma determinada situação concreta de tratamento de dados. Esse entendimento, de certa forma, descreve a hipótese de existência do legítimo interesse.

Antes disso, as propostas que tramitavam, tanto no Congresso, quanto no âmbito do Ministério da Justiça, não previam o legítimo interesse e tinham o consentimento como base legal ‘’principal’’.

Foi na 2º Consulta Pública do Anteprojeto de Lei de Proteção de Dados, a partir das contribuições de distintos setores, que se discutiu com mais profundidade a inclusão dessa nova base legal. Desse modo, ela é válida, principalmente, para a equalização de todas as hipóteses autorizativas, sem a prevalência de nenhuma sobre as outras. Todo esse processo foi responsável por dar vida ao legítimo interesse na LGPD hoje existente.

O legítimo interesse na LGPD: caso prático

Legítimo interesse na LGPD

Para ilustrar o conteúdo passado brevemente em nossa introdução, iremos descrever um caso prático. Este, por sua vez, foi classificado na fase 3 da agenda regulatória. Ou seja, ele foi incluído na agenda menos prioritária. Sendo assim, sua elaboração pode durar o período de até 2 anos. Durante esse longo período, outros atores, como o judiciário quando acionado, e o próprio mercado, se movimentarão cada vez mais para dirimir eventuais dúvidas que restam sobre a aplicação das bases legais da LGPD. Estes ainda disputam uma série de teses jurídicas. E nesse sentido, as hipóteses autorizadas confirmam cada vez mais o interesse legítimo no tratamento de dados pessoais.

Esse legítimo interesse, de certa maneira, é novidade no ordenamento jurídico brasileiro. Isso porque, até então, previamente ao advento da LGPD, as leis setoriais em vigor priorizavam o consentimento como base legal para o tratamento de dados pessoais em segmentos específicos. E, mesmo durante o processo que culminou na aprovação da lei, esse legítimo interesse só despontou em 2015. Em outras palavras, tudo se desenrolou somente após 5 anos de debate. Estes incluíam propostas provenientes tanto do executivo quanto do legislativo.

O interessante é que além de um processo relativamente novo, ele também se configura como uma base legal que pode abarcar uma maior amplitude  de situações. Para muitos, trata-se de um procedimento muito mais flexível,  sendo este um senso comum quanto ao cumprimento de obrigação legal ou regulatória ou execução de contrato. Também é necessário citar outro fator que abre espaço para discussões e disputas sobre o legítimo interesse. No caso, o legislador optou por dedicar a ele um artigo específico (art. 10). Este dita alguns parâmetros para a sua aplicação. Tal decisão nos remete ao projeto Memória da LGPD, que conta a história da formação da lei e seus dispositivos.

E qual a conclusão sobre o caso?

O caso nos demonstra que é necessário fortalecer o diálogo multissensorial, que para muitos foi o principal responsável pela criação da LGPD. Nesse sentido, a Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa produziu um policy paper sobre a base legal do legítimo interesse. Tal questão possui sua importância, tanto na teoria quanto na prática. Dessa maneira, seu principal intuito é contribuir com o debate permanente que se instalou na comunidade jurídica acerca de diferentes aspectos da LGPD.

O documento em si trata do histórico dessa hipótese autorizativa e também aborda as questões em aberto consideradas mais relevantes. Assim sendo, os pontos de destaque são o legítimo interesse de terceiro, a legítima expectativa do titular de dados, o direito de oposição em face dessa base legal.

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